A cada dia que passa nos vemos mais envoltos em uma fase da história humana em que o físico se mistura de forma gradativa, rápida e indissociável do mundo virtual. São tantas as maneiras e formas de nos conectarmos que atos simples, como olhar as horas, mesmo que em um relógio de pulso, pode gerar dados que ficarão disponíveis no mundo virtual.
Nossa geladeira, nossa televisão, nosso carro, os estudos e nossa alimentação, tudo está conectado com o mundo virtual. A atual pandemia apenas aumentou e acelerou essa fase da história que já era uma realidade.
Com tamanha conectividade é natural que estejamos muito mais expostos do que antigamente, alguns, inclusive, gostam e se submetem a exposições maiores, diárias e com uma frequência quase que a tempo real. Esses ganham dinheiro e fazem da exposição sua forma de trabalho, são os “digital influencers”.
Todas as informações que chegam para nós nos geram sentimentos, com os chamados digital influencers, empresas e até mesmo pessoas que não são tão populares ocorre o mesmo. Ao depararmos com uma fala ou um ato sentimos afinidade ou repulsa, muitas vezes, comunicamos esse nosso sentir com palavras ou expressões, o que, em um momento em que estamos numa constante interação, também é facilmente repercutida.
É justamente nesse momento em que reações negativas em cadeia, de uma pessoa que fez ou falou algo reprovado, ganham força e eclode uma onda conhecida como “cancelamento virtual”. O cancelamento virtual é o ato de rejeitar e ignorar totalmente alguém por seu ato.
Analisando de forma jurídica, o cancelamento virtual demonstra atitudes de ódio e intolerância no meio digital. Essa situação agrava-se ainda mais por não ser possível, ao ser ou empresa que está sendo alvo dessa ação, justificar-se. Torna-se um movimento em que o coletivo atua como julgador de uma situação e não oferece oportunidade de contraditório e ampla defesa, princípios que são a base do sistema jurídico brasileiro e por motivos nobres: todos devem poder argumentar sua visão e o seu lado dos fatos.
Outra questão a ser pontuada é que o cancelamento digital pode gerar duas reações na situação:
1) a pessoa ou empresa acaba ganhando mais notoriedade e ficando mais visível;
2) pode gerar danos gravíssimos a quem é alvo, danos inclusive de ordem psicológica.
Fato é que, embora muito comum nos dias atuais, é um tema que o direito brasileiro não está pronto para julgar, inexistem leis específicas para a situação em tela e, cabe aos advogados e juristas, usar de analogia e exemplos estrangeiros para defender seus clientes enquanto inexistir legislações específicas.